“…Meu sofrimento e meu compadecimento – que importam? Desde quando viso a felicidade? Eu viso a minha obra!”
- Friedrich Nietzsche (Assim falou Zaratustra)
Acervo Edu Tadeu
Esta é uma amostra do trabalho de um homem que viveu para criar e criou para viver. Edu Tadeu dedicou cada um dos dias de seus sessenta e oito anos à Arte. Inclassificável: Arte Bruta em materiais, Arte Visionária em temas e abordagens, Arte Sequencial não apenas no conceito quadrinista, mas sobretudo no eterno retorno de temas e imagens.
É assim que a analogia entre o dragão celeste chinês e a serpente emplumada das civilizações pré-colombianas vai se repetindo em suas narrativas visuais, desde a revista Mitacoré de 1993 até os trabalhos mais recentes. Os esboços relativos a “Gonzalo de Marvisante”, no que parece ser apenas um projeto inconcluso são, na realidade, um tema que se desdobra em múltiplas narrativas em diferentes tempos e linguagens. “Candinho, uma saga” foi livro, fanzine, novela de rádio e trabalhos acadêmicos. A profundidade da pesquisa e a enormidade de trabalho plástico e literário já realizados para o projeto “Chuva e Barro” uma graphic novel projetada para as comemorações dos 60 anos de Londrina que não foi concretizada à época, certamente merecem estudos e continuidade.
A tentativa de resgatar, organizar e inventariar essa obra vem também marcada pelo signo do trabalho incompleto. Inúmeras e insuspeitadas conexões, verdadeira câmara de ecos, cria de um bom anarquista, a obra de Edu Tadeu não acata facilmente catalogações e categorizações.
Concebida e parida na liberdade, é assim no entanto que sobreviverá ao autor – caos e gênio espremidos em caixas. Foi a parte que me coube desse latifúndio e é assim que a ofereço em nome de Edu Tadeu – como trabalho em progressão de/para homens em processamento.
Etel Frota
irmã e curadora
Artes Visuais
Escritos
(depoimentos/diários, manuscritos, cartas, esboços HQs, contos, dramaturgia, poesia. Todo o material, impresso e manuscrito está em processo de datação, organização, digitação e/ou digitalização – ETEL FROTA)
1978 – NOS BEIRAIS DO MUNDARÉU –escritos diversos
1981 – O DEPÓSITO – Peça Teatral, ato único. Em parceria com Roberto Andrade Martins (inédita)
1982 – ANDRO E A ORIGEM DO HOMEM – Peça para bonecos e um personagem quase humano. Em parceria com Roberto Andrade Martins (inédita)
REPINICO OU A SAGA DE UM GATO – conto
ANA COLORINDO A VIDA BRINCANDO – Peça Teatral
O VAZIO & OUTROS FRAGMENTOS – contos
2020 – METADIÁRIO DE BORDO DE UMA NAVE EM CRUZEIRO ESTACIONÁRIO – conto
1998/2025-nuar [quatrocentos e cinquenta e quatro dias, três cartas, doze haicais, dezesseis contos e um eterno retorno]
(em digitação, Etel Frota)
MANUSCRITOS
imprensa
21/4/1976 – ‘Os premiados do Safra’ – Folha de Londrina
1/8/1976 – ‘Exposição aberta’ – Folha de Londrina
3/8/1976 – ‘Primeira Coletiva’ – Folha de Londrina
30/3/1979 – ‘Exposição Arte em Batik’ – O Boletim – AABB
3/4/1979 – ‘NUM BAR: A arte em batik de Eduardo Souza’ – Folha de Londrina, entrevista – coluna “Qual é a deles”, não assinada
“…com seus 23 anos incompletos, Eduardo é desenhista, pintor e assíduo leitor do I-Ching. [ ] Ao que tudo indica, essa é a primeira vez que Eduardo concede uma entrevista…”
25/6/1981 – ‘Óleos e batik em exposição’ – Folha de Londrina
10/9/1982 – ‘Técnicas de Batik’ – Diário do Paraná
“…Eduardo Tadeu estará falando sobre e ensinando como se faz o batik, do mesmo modo como o fazia o valente estampador da lenda…”
junho/1983 – ‘Uma nova disposição’ – COMTEXTO, Cláudia Gabardo
“…A Livraria Dario Vellozo está crescendo e um dos sintomas mais significativos deste crescimento é a permanente necessidade de público. Para trazê-lo até ela o artista Eduardo Tadeu está criando um cartaz que, dentro em breve, será espalhado pela cidade.”
6/6/1985 – ‘A arte em diversas nuances’ – Folha de Londrina – Folha da 6ª
25/6/1986 – ‘Artistas de pés vermelhos’ – Folha de Londrina – Caderno 2
“Uma coletiva que busca a conquista do espaço e a divulgação dos trabalhos de sete artistas plásticos do norte do Paraná…”
4/7/1986 – ‘Arte nas paredes’ – Folha de Londrina – Programa
“ …o grupo de artistas plásticos de Londrina [ ] ‘Pés Vermelhos’ também está se propondo a realizar um trabalho de ocupação de paredes ociosas com obras de arte.”
30/8/1987 – ‘Protesto sem palavras’ – Folha de Londrina – Política
7/7/1989 – ‘Eduardo Tadeu ensina a fazer quadrinhos’ – Folha de Londrina– Caderno 2
24/11/1989 – “Vem aí o no 1 de Primeira e Única” – Folha de Londrina – Caderno 2
26/4/1990 – ‘K’an, uma revista da vanguarda londrinense’ – O Estado do Paraná, Aramis Millarch
https://millarch.org/artigo/kan-uma-revista-da-vanguarda-londrinense
16/5/1991 – ‘Herói anônimo enfrenta o Capitão Tédio’ – Folha de Londrina – Caderno Dois
“Estreia amanhã, na sessão de quadrinhos da Folha, Anônimo, o herói, criação do desenhista paranaense Eduardo Tadeu”
11/3/1992 – ‘Quadrinista defende criação nacional’– Correio de Notícias–Programe-se
12/3/1992 – ‘Os “Heróis Anônimos” de Eduardo Tadeu’ – Jornal do Estado – Espaço dois – Arte Gráfica, Ruy Barrozo
24/5/1994 – ‘Londrina em quadrinhos’ – Folha de Londrina – Folha 2 – Visuais, Telma Elorza
14/10/1994 – ‘Efêmeros & Perpétuos – a missão’ – Folha de Londrina – Cultura, Lúcio Horta
“…teve sua primeira edição no final da década passada com exposições e performance na sobreloja do edifício Julio Fuganti. [ ] Os artistas prometem invadir o prédio da Cadeia Municipal, com diversas atividades: limpar o local, fazer instalações de arte em cada cela, produzir um vídeo-documentário…”
12/3/1996 – ‘Heróis Anônimos – mostra e filosofia’ – O Estado do Paraná – Almanaque
“…Queremos dar uma nova versão aos heróis, que continuam sendo o centro da história, porém apresentam-se como um ser humano comum, que sofre, perde e luta pela sobrevivência.”
26/4/1999 – ‘Figurinos, um espetáculo à parte’ – Folha de Londrina/ Folha do Paraná – Visual
15 a 22/12/2000 – ‘Malucos se unem e aprontam no Valentino’ – O Popular
“Neuza Pinheiro, Eduardo Tadeu e Augusto Silva: espetáculo ‘Vagais e Musicais’ mistura música, artes plásticas etc…”
20/12/2000 – ‘Trio derrama criatividade no palco’ – Folha de Londrina/ Folha do Paraná – Folha Dois
20/11/2002 – ‘Zumbi dos Palmares em praça pública’ – Jornal de – JL Cultura, Francismar Lemes
“Artista plástico prepara monumento em homenagem ao herói da resistência negra para ser instalado em espaço aberto da Cidade”
11/5/2003 – ‘Arte no Calçadão’ – Folha de Londrina – Caderno Paraná/Geral
5/6/2003 – ‘Zumbi dos Palmares volta para o criador’ – Folha de Londrina – Caderno Paraná, Vanessa Navarro
“Cansado de esperar por um local para sua obra, Eduardo Tadeu diz que não vai mais entregar a estátua ao poder público”
11/4/2004 – ‘Oficina de desenho ensina a “soltar o traço”’ – Folha de Londrina – Folha Dois, Jackeline Seglin
15/12/2006 – ‘O espírito natalino sob a ótica artística’ – Folha de Londrina – Visuais, Liliana Onozato
4/1/2009 – ‘A gravura e as novas tecnologias’ – Folha de Londrina, Nelson Sato
https://www.folhadelondrina.com.br/folha-2/a-gravura-e-as-novas-tecnologias-667587.html?d=1
17/2/2016 – ‘Oficina’ – Tribuna Hoje
“…exposição ‘Os Fragmentos’, referente à parte do trabalho de pesquisa e edição de um livro elaborado – entre os artistas de Londrina Augusto Silva, Marcelo Galvan e Edu Tadeu. São imagens originais de 20 ou 30 anos atrás e de antes de ontem, modificadas digitalmente..
21 e 22/2/2016 – ‘Umuarama verá exposição com imagens incríveis executadas pelas novas mídias digitais’ – Umuarama Ilustrado
12/4/2017 – ‘Um canto ao poeta’ expõe obras da coleção de Thiago de Melo – Amazonas Atual
https://amazonasatual.com.br/um-canto-do-poeta-expoe-obras-da-colecao-de-thiago-de-melo/
“…O acervo inclui, ainda, obras de seis artistas brasileiros: Aldemir Martins, Eduardo Tadeu, Fayga Ostrower, Humberto Espíndola e Sueli Piazzetta…”
16/3/2022 – ‘Ilustrações que fazem a história da FOLHA com humor e arte’ – Folha de Londrina, Marcos Roman
“…‘Optamos por tematizar a exposição selecionando trabalhos que retratam problemas nacionais ligados à pobreza, desenvolvimento e tecnologia. A exposição conta com obras assinadas por diversos artistas. Entre eles Flávio Padovezi, Douglas Mayer, Beto, Eduardo Tadeu, Regina Menezes e Degar’, informa Marco Antonio Neves Soares”
25/12/2024 – ‘ Morre Eduardo Tadeu, um nome das artes múltiplas de Londrina’ – Folha de Londrina, Célia Musili
Anexos
(Projetos em múltiplas linguagens, que abrangem décadas, reunindo extensa pesquisa, argumentos escritos, esboços, pranchas prontas, etc. Aos cuidados da curadora, serão analisados, classificados e gradualmente incorporados a este acervo)
[ANEXO 01] CANDINHO, UMA SAGA
Nos anos de 2006 e 2007, Edu Tadeu fez uma longa entrevista com o pai, o Candinho, um contador de causos dono de memória prodigiosa. Gravado e transcrito, esse material foi a matéria prima para o livro “Candinho, uma saga”, em que o autor recriou, em forma de crônicas, os momentos marcantes da vida do homem que nasceu na zona rural de Abatiá, norte do Paraná, ainda na vigência da Primeira Guerra Mundial. Semialfabetizado formal, Candinho testemunhou a colonização da região e foi um arguto observador do cotidiano e do contexto global de seu tempo. Inicialmente idealizado para publicação na celebração dos 90 anos de Candinho, em 2008, os originais permaneceram inéditos.
Graduando de História na UEL à época, Edu usou um recorte do relato no trabalho acadêmico “22 de maio de 1937: o caso Valdemar. Morte e vendeta no bairro rural nos primórdios do Norte do Paraná” e no trabalho de conclusão de curso, na forma de roteiro de radionovela, “O Trem da Memória”. Na mesma época, publicou o fanzine “Candinho, uma saga – Livro das origens, Tomo Primeiro”.
Permanece inacabado um segundo fanzine cujo prólogo
Pela extensão da pesquisa e intertextualidade entre as linguagens usadas pelo autor, todo esse material foi mantido reunido: esboços, estudos de personagens, anotações, originais corrigidos de próprio punho pelo protagonista, incluindo documentos pessoais do Candinho, álbuns de fotos, CDRs com os áudios das entrevistas e arquivos de texto com as transcrições, etc, e permanece neste acervo, à exceção dos esboços de um segundo fanzine inacabado, cujo “Prólogo” inicia no velório de Candinho e continua com “A última posição do guerreiro”. Este último material estará em poder da curadora para análise e cotejo dos vários roteiros advindos dessa extensa pesquisa.
[ANEXO 02] CHUVA BARRO (ou ‘ÁGUA DO CÉU, BARRO VERMELHO – um épico caipira’)
Projeto de novela gráfica conduzida por um longo poema épico
“…Festou rico, festou pobre,
festou plebeu, festou nobreNem todo mundo entendeuporquê de tanta festança
mas não teve quem não entrassepouquinho que fosse, na dança
De “Redondo” era chamado
em Londrina o clube nobre
enquanto que no “Quadrado”
juntava-se o povo pobre
(Não há como comprovar
que tudo foi mesmo assim,
conforme será contado,no dia 1 da cidade;
Sei que, no que toca a mim,tudo isso aconteceu
tal e qual vai ser mostradocomo expressão da verdade…”
Inicia em Londres e abrange a história da ocupação da região, a fundação de Londrina (1934) e toda a história da sua colonização, passando pela cosmologia do povo originário que ali vivia.
Apresentada, em 1994, como um projeto para as comemorações dos 60 anos, não foi aprovada. As circunstâncias estão relatadas na matéria – ‘Londrina em quadrinhos’ [IMPRENSA]
Além do poema e dos esboços dos quadrinhos, fazem parte deste material o livro ‘VIDA KAIGANG (fotografias de Carllos Bozelli, 2001), além de 24 pranchas 35 x 50 cm, tinta acrílica e óleo sobre tela ou outros suportes – com as intervenções de textura e materiais peculiares do autor – uma impressionante coleção de originais de grande apuro técnico e semiótico.
Tudo permanece aos cuidados da curadora e será posteriormente incorporado ao acervo físico.
[ANEXO 03] MARVISANTE
Talvez a maior das obsessões de Edu Tadeu, Gonzalo de Marvisante – genovês sobrevivente de Constantinopla – acompanhou toda a sua trajetória, ao menos desde o filme de ‘1492 – Conquista do Paraíso’, de Ridley Scott (1992). Transformou-se no conto ‘Chuva de Primavera em Bizâncio’, em várias pranchas de estudos e obras acabadas, seu email [marvisante@gmail.com], pseudônimo em alguns momentos e a carta de despedida de Gonzalo, um manuscrito dos anos 1990 que revela coincidências com a trajetória do autor.
‘Estou velho e não tenho herdeiros legais. Perdi cinco dentes e sou marcado por dezenas de cicatrizes, no corpo e na alma. Quando eu me for, [ ] levarão tudo e descontinuarão meu nome de família. Marvisante nunca mais. [ ] Todas as minhas memórias ficarão trancadas num baú e esquecidas num porão de um arquivo morto pelos séculos afora até que o mofo as destrua e as traças as devorem, depois de eu as ter carregado através de florestas escuras e úmidas, infestadas de selvagens ferozes e de doenças tropicais.’
Pranchas, estudos de personagens, o livro ‘Bizâncio’ (Philip Sherrard) manuscritos, esboços de quadrinhos: todo este material, sob guarda da curadora, deverá passar por refinamento na separação para ser posteriormente incorporado ao acervo físico.
[ANEXO 04] AMAZONTOWN
“…último refúgio terráqueo, depois da guerra no Oriente Médio – Israel e Palestina destruídos, devastação de toda reserva hídrica/ ecológica. Guerras localizadas na África e Ásia. Mudança climática. Cometa perto. Tsunamis de 60 metros em Manhatta. Japão afunda; reconfiguração das placas/ falhas tectônicas. Andes quase desaparecem. Amazônia se eleva (purgatório). Rios sugados. Mínimas reservas hídricas, canalizadas…”
Narrativa distópica & profética, na fronteira do delírio, em que desnascidos e incriados confrontam-se no espaço virtual. Protagonizada por Samuel Spada, Lídia e Catman. Argumento e linguagem vertiginosos, esboços detalhados , glossário de “palavralises”, a saber:
…veromíssel, severossímio, verossímio, teveelisão, brincarnivoragem, eletrairagem, carnavalha, intelecutaleatoriedades, desmotivocábulos, ferozgasmo, preciprece, presuposposto…
Mais um material para análise, organização e posterior incorporação ao acervo físico.